O Escafandro e a Borboleta

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Filme sensível e tocante que nos faz refletir sobre o que o ser humano pode construir a partir de tragédias aparentemente insolúveis. A história real do editor da revista Elle, Jean Dominique Bauby, antes cercado de sucesso, lindas mulheres, dinheiro, poder e de uma família com filhos amorosos e ex-mulher apaixonada. Sofre um derrame cerebral, sendo acometido por uma rara condição denominada “síndrome do encarceramento”. Tal estado permite que o protagonista desta história real entenda, raciocine normalmente acerca de tudo o que ocorre a sua volta, sem no entanto conseguir comunicar-se com o mundo externo. Sua única forma de troca com o meio é o piscar de um olho. A partir de sua condição, sua foniatra desenvolve um método a partir do qual Bauby consegue formar palavras e frases piscando este olho, enquanto ela soletra as letras mais utilizadas do alfabeto.

Muitos talvez pensassem: para que viver neste estado@ o que se pode construir sem conseguir movimentar o próprio corpo@ que prazeres desfrutar e como se relacionar desta forma@ Tais questionamentos provavelmente passaram pela cabeça de Bauby. Como mostrado no filme, inicialmente pede para morrer. No entanto, a grande reviravolta surge quando ele mesmo se percebe com capacidade para escrever um livro. Na realidade, re-escrever sua história, tecer a trama da relação consigo próprio, para então rever o seu modo de atuar com as pessoas a sua volta. Tecer seu casulo, para depois viver sob uma nova condição. Construir um novo modo de vida dentro do escafandro de seu corpo aprisionado, mas ter a alma livre como uma borboleta. Decide manter seu contrato com uma editora, feito antes do derrame cerebral. Escreve sua autobiografia. Através de sua elaboração, busca reparar sua vida e seus relacionamentos. Neste ponto do filme, páro para refletir. O quanto é essencial ter um projeto de vida para manter a vida dentro de nós! Quantas pessoas vivem o dia a dia sem parar e pensar na importância do viver e de como desfrutam cada dia! Somos tentados a viver freneticamente, sem nos darmos conta de que escolhemos a cada minuto. No ritmo desenfreado das tarefas diárias, se não pararmos para realmente perceber como nos inserimos em tudo o que fazemos, somos tentados a seguir robotizados pela vida. Um momento de parada, um tempo para olhar para si próprio se faz necessário para buscar aquilo que realmente é possível construir e chamar de felicidade. Talvez o que mais tenha tocado neste filme é que uma condição aparentemente desprovida permitiu a este editor realmente olhar para si próprio e para o modo como se relacionara até então com as pessoas a seu redor. Segundo sua própria visão demonstrada no livro que escreve, percebe que anteriormente vivia cercado por estímulos de toda sorte, sem no entanto valorizar do mesmo modo seus filhos e outras pessoas a quem amava. Sem correr o risco de ser piegas, é claro que nenhum de nós deseja chegar a tal ponto para rever a própria vida, nem é disto que trata esta análise. No entanto, olhar para o cotidiano e nos responsabilizarmos pelo modo como nele atuamos é fundamental para tomarmos a rédea da vida em nossas mãos.

A construção de um projeto de vida é essencial para nos sentirmos parte de um todo. Descobrir aquilo que desejamos e seguir adiante em busca de sua concretização permite o contínuo movimento da vida. Alcançar algo não significa parar, mas descobrir novos desejos e novos movimentos a serem construídos para torná-los viáveis. Desejar significa estar tão consciente de si próprio, que é possível perceber aquilo que realmente é importante para si e não para aqueles que nos cercam. Aquilo que a sociedade chama de desejo, muitas vezes significa consumo de algo. Quantos produtos na mídia nos são apresentados como nosso maior desejo@ Na realidade é um desejo ou uma demanda para agradarmos ou parecermos algo para alguém@ Bauby consegue perceber o quanto a demanda apagou seu desejo. Consegue rever o que é seu desejo real e com ele vive, o que é diferente de sobreviver. Viver é ser movido pelo próprio desejo. Sobreviver é ser movido pela demandas dos que nos cercam, esquecendo o que é de verdade ser indivíduo que pensa, sente, deseja, constrói, escolhe.

A psicoterapia corporal permite um caminho rumo a descoberta do próprio desejo. Unindo o trabalho com o corpo e o trabalho verbal, possibilita a redescoberta das próprias sensações e sentimentos, abrindo uma via de conexão com o inconsciente. Deste modo, permite a conscientização necessária para escolhas mais embasadas no próprio ser, podendo deslizar de um modo de vida robotizado para um viver mais integrado consigo e com o mundo.

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