Crise ética

A crise ética que permeia nossa sociedade talvez seja a maior crise que nos assola. Quando me refiro à Ética, não falo acerca da moral ou de moralismos. .

O significado da palavra Ética vem do grego ethiké que se refere ao “estudo dos juízos de apreciação referentes à conduta humana suscetível de qualificação do ponto de vista do bem e do mal…” (Dicionário Aurélio). Ser Ético implica em manter uma postura congruente com aquilo com que se compromete. Algo que chamamos de “manter a palavra”, seguir o acordo. E aqui chegamos a uma palavra fundamental: contrato.

O que contratamos conosco mesmos e com os outros? Mantemos os acordos que fazemos? Os acordos, como a vida, podem ser flexíveis, revistos, revisitados e novos acordos então estabelecidos. No entanto, o que vemos atualmente é uma série de acordos sendo desfeitos, sem que a outra parte implicada seja ouvida. Qualquer acordo implica em expectativas mútuas. Quando se “quebra um acordo”, quebra-se também o elo existente entre as pessoas. Quebra-se a confiança. Além disso a disponibilidade para manutenção da relação.

Se analisarmos o contexto mais amplo, o que podemos observar quanto a Ética? Nosso planeta está sendo destruído em função da ganância de uns poucos. Nossos recursos naturais se esgotam em função da falta de consciência de coletividade. O “olhar para o próprio umbigo” tornou-se algo freqüente em detrimento do “olhar para a coletividade”. A visão Ética a qual me refiro implica em olhar aquele que se encontra ao seu lado e olhar em direção ao futuro. É um olhar inteligente, que busca meios de atuação a partir da cooperação. É inteligente porque é o único meio real de construir algo sólido. Ninguém constrói qualquer coisa que seja, sozinho. Todos necessitamos de algo de outrem para qualquer coisa que desejemos realizar. E o olhar para o “próprio umbigo” implica em ver e relacionar-se com as pessoas segundo uma “ótica de uso”. Explico-me: estar com esta pessoa enquanto ela me forneça aquilo que eu desejo e descartá-la quando não mais servir aos meus propósitos.

Ouço diariamente em meu consultório queixas de diversas pessoas quanto a dificuldade de construir relações sólidas. Tal dificuldade aplica-se não apenas a relacionamentos de casal, senão a relações de amizade, familiares, etc. A verdadeira queixa por trás de tudo é a dificuldade de confiar no outro. Na realidade, uma desconfiança. Mas, se pensarmos bem, para se desconfiar, foi necessário confiar previamente. No entanto, algo aconteceu para que se retirasse a confiança daquela relação. Padrões muitas vezes se repetem, sendo construídos em nossa mais tenra infância e seguindo pela vida adulta, sendo ou não reforçados. E o padrão de desconfiança é cada vez maior em nossa sociedade. Isto gera a disponibilidade para relações cada vez mais pobres afetivamente, superficiais, sem entrega genuína. A dificuldade na entrega, no contato com o outro termina por reforçar a queixa da solidão, do vazio interior, da depressão, do pânico, dentre outras patologias cada vez mais em voga no momento atual. E, quanto maior a falta de Ética, maior a desconfiança, maior o reforço para o afastamento entre as pessoas. Quanto maior o desrespeito, a impossibilidade de colocar-se no lugar do outro e de ouvi-lo, maior e mais espesso o muro construído entre as pessoas, maior infelicidade e ilusão de controle. Ilusão esta que se desfaz quando se percebe a verdadeira solidão e que o ego não se sustenta sem a relação de troca com o outro. Controle porque aquele que se relaciona a partir de uma “ótica de uso”, possivelmente constrói patrimônio, sem, no entanto, trocar afeto genuíno. Quiçá saibam como é bom o afeto verdadeiro!

Segundo a ótica da Psicoterapia Corporal, a crise Ética, o “olhar para o próprio umbigo” refere-se ao encouraçamento criado no bojo de uma sociedade cada vez mais desprovida de recursos afetivos. As couraças são defesas que se revelam através da restrição do funcionamento corporal (células, músculos, glândulas) impedindo a expressão da vitalidade com a qual nascemos. Também se expressam em nosso modo de agir, através de nosso caráter (nosso jeito de ser que se torna pouco flexível e impede um viver mais espontâneo). No processo de psicoterapia corporal aliamos a escuta de base analítica com técnicas de intervenção corporal. Atuamos na elaboração de conteúdos conscientes e inconscientes, comum a todos nós seres humanos. Partimos da integração entre o que é dito e vivenciado no corpo como bloqueios (couraças) ao livre fluxo de energia. Temos por objetivo atuar sobre os bloqueios, facilitando a sua flexibilização e conseqüente aumento de vitalidade e disponibilidade para a vida.

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